Sexo e pornografia na pandemia

A pandemia trouxe muitas transformações para a sociedade e entre quatro paredes as mudanças se fizeram mais intensas e limitantes. Links e mais links, buscas incessantes com os mais variados títulos, roteiro bem elaborados (ou nem tanto), um viés com destaque para o público masculino. Essa busca pode se caracterizar com um vício que se mantém escondido, dominando os pensamentos e barrando as ações. 

O período de quarentena vem apresentando reflexos que estão muito além da questão de saúde pública. Enquanto muitas empresas precisaram fechar as portas durante a pandemia, a indústria de filmes eróticos aumentou seu alcance e conquistou novos adeptos.

De acordo com estudo feito pela Netskope, empresa americana de software de segurança, o número de acessos a sites pornô cresceu 600% durante o isolamento, se comparado ao ano anterior.

Com grande parte dos trabalhadores adaptando seu formato de trabalho para o home office, algumas mudanças de comportamento foram se desenrolando e o limite entre profissional e pessoal acabou se confundindo, em muitos casos.

Os efeitos do pornô nas relações sociais

Desde março, quando o isolamento social foi decretado, uma das maiores plataformas de filmes adultos anunciou um período de liberação gratuita do acesso premium, talvez como uma saída para estimular o lockdown que ainda estava em baixa. Essa ação resultou em um aumento de mais de 39% no consumo de vídeos pornô, no Brasil.

Graças a essa rotina nova e aos hábitos adquiridos, muitos casais começaram a relatar um distanciamento progressivo, que piorava ainda mais com o avanço da pandemia. Podemos ligar essas mudanças nos relacionamentos ao consumo de filmes adultos? Talvez. Mas o fato é que a indústria conhece muito bem os hábitos de consumo de seu público, o que fez com que se intensificassem, ainda mais, as buscas e as longas horas como expectador.

Outro ponto muito importante a ser levantado é a exposição a tais conteúdos, que afeta a socialização sexual dos indivíduos, assim como a objetificação da mulher, com expectativas irreais de desempenho e estereótipos.

A ideia de sexo na cabeça de muitos jovens e adultos é completamente distorcida, alimentando a ilusão de uma relação sexual que não é real. Ou seja, há uma grande pressão para que o próprio desempenho seja além das expectativas do outro, o que gera um ciclo perigoso de frustrações. A indústria do sexo para além de um maior autoconhecimento, em muitos cenários acaba por incentivar o sexo como um ato de encenação muito mais que de troca afetiva. Determinando muitos desencontros e insatisfação.

A busca pelo sexo cinematográfico

De acordo com um relatório do Comitê Britânico de Classificação de Filmes divulgado em 2020, 18% dos adolescentes com mais de 16 anos e ativos sexualmente, praticaram ou receberam a proposta de realizar praticas comumente vistas em filmes pornô. O mesmo relatório afirma que 30% dos adolescentes com mais de 16 anos, afirmaram que o sexo praticado não correspondia com as expectativas despertadas pelos filmes pornô.

O sexo ideal para muitos traduz o que se consome na indústria pornográfica, frustrando muitas vezes as expectativas traçadas mesmo para adultos. Por exemplo, um casal que consome filmes pornô e que se excita com as práticas ali retratadas, pode facilmente sentir-se frustrado com a realidade praticada, diminuindo o apetite sexual, causando conflitos entre si e desestimulando a relação.

Sexo na pandemia

O isolamento social aproximou ainda mais as relações familiares e muitos casais passaram mais tempo juntos, o que deu certo para uns, mas acabou sendo o estopim para a separação de outros. Neste cenário, a relação sexual também se transformou, intensificando ou esfriando, colocando em cheque os conflitos até então limitados ao contato.

Foi preciso investir na relação e passar por um processo de aprendizado, como no inicio do relacionamento. Esse período também contribuiu para o autoconhecimento, onde o prazer do outro não era a única prioridade, abrindo espaço para diálogos sobre prazer e sexualidade em muitos lares que antes não cultivavam este hábito.

Os solteiros, que precisaram interromper suas vidas agitadas, começaram a refletir sobre seus corpos, sua mente e a conexão de ambos na busca pelo prazer. Os app de relacionamento se tornaram uma ferramenta de estimulo e entretenimento, criando expectativas para o pós pandemia, deixando de priorizar o sexo nas relações, construindo novos diálogos e conexões.

Diante do limitante cenário, a mente se tornou foco finalmente, sendo assunto central em muitas conversas e pesquisas na internet. Todos queriam saber o real papel do cérebro na busca pelo prazer e investir de verdade em novas formas de estimulo, muito além do toque ou do visual.

sexo

Consumo problemático e dependência

Estimativas apontam que mais de 42% dos usuários de internet acessem pornografia e que cerca de 25% das buscas diárias sejam direcionadas a este material. Estes dados são relevantes e emergentes, apontando um problema crescente, principalmente considerando a facilidade em acessar estes sites.

O acesso a filmes pornô não é um problema, mas pode se tornar, caso o indivíduo apresente descontrole e passe a consumir em excesso. Relacionadas a este consumo desenfreado, algumas emoções e cognições negativas podem se mostrar, ligadas ao vício. Por exemplo:

  • Vergonha e culpa;
  • Perda de emprego e produtividade;
  • Isolamento social;
  • Dificuldade de concentração;
  • Angústia e irritabilidade;
  • Gastos financeiros descontrolados e excessivos;

Estudos apontam que o consumo compulsivo de pornografia equivale aos efeitos da dependência de substâncias, interferindo a vida pessoal e profissional do indivíduo, causando mudanças cognitivas que estimulam ainda mais o seu consumo.

Certos ambientes podem colaborar para este comportamento, por estarem diretamente associados a agentes facilitadores. Esses gatilhos precisam ser mapeados e reconhecidos, para que se evite a prática. No vício ocorre um processo mental em que a pessoa deposita sua atenção nas informações sobre aquele comportamento, criando imagens mentais sobre aquilo.

Isso acontece porque o indivíduo acredita não conseguir controlar seus impulsos, sentindo-se fora do controle e apenas a sua satisfação e realização conseguem dar vazão e sanar este desconforto. Como se não pudesse sobreviver até que se encontre com o objeto que deposita sua obsessão.

Tratamentos e boas práticas

Pesquisas apontam sobre a eficácia de procedimentos e tratamentos com base na aceitação e no compromisso (ACT), funcionando como uma psicoterapia que visa seis processos:

  1.       Aceitação: não evitar, apenas aprender a lidar e controlar.
  2.       Desfusão: diminuir o controle dos pensamentos sobre as ações, mudar a relação com o pensamento.
  3.       Processos do “self”: eliminar o apego a pensamentos sobre si mesmo.
  4.       Processos do momento presente: notar como o seu interior e exterior se relacionam a experiências à medida que elas acontecem.
  5.       Valores: definir e se orientar através de valores pré-definidos, de forma a aprimorar áreas da vida.
  6.       Comprometimento-ação: mover-se. Seguir os caminhos traçados a fim de sua realização de desenvolvimento pessoal.

Conclusão

A partir do momento que o indivíduo reconhece seu consumo excessivo como um problema e apresenta desejo de mudança, terá uma oportunidade para refletir e se mover na direção dos seus valores e objetivos morais, sem vícios ou impulsos, apenas confrontando os seus monstros. Fantasias sexuais são bem vindas na vida, alimentam as possibilidades de uma busca por encontros sexuais prazerosos. No entanto, quando as fantasias deixam de fazer parte da vida para simplesmente guiarem qualquer decisão ou necessidade se faz necessário refletir. 

Saiba encontrar o seu real prazer e se concentre em estar bem consigo mesmo. Separe momentos íntimos com você, de modo a buscar um autoconhecimento. Sua vida sexual precisa fazer sentido para você, seja sozinho ou acompanhado, afinal é preciso estar bem para construir uma sexualidade saudável e prazerosa.

Caso já não tenha mais controle, ou mesmo, a pornografia virou uma obsessão sem trégua, vale a pena dar uma pausa aí e buscar apoio em saúde mental. Em nosso portal você encontrará a página de “atendimento” onde poderá buscar apoio e orientação.

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